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Afinal, o que fez o Grupo Americanas?

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Por Vinicius Rios Bertuzzi

O ano passado foi marcado por uma queda nos pedidos de recuperação judicial no Brasil. Segundo levantamento realizado pela Serasa Experian, houve uma redução de 6,5% dos requerimentos de renegociação coletiva na comparação com 2021, sendo que 2022 teve o menor número de pedidos desde o ano de 2015. Mas por que?

Em um cenário pós-pandemia, tendo muitas empresas dificuldades com caixa e resultados menos expressivos, os empréstimos tomados a taxas mais baixas nos últimos anos estão sendo renegociados com juros mais elevados e a perspectiva é de manutenção da Selic em patamares ainda altos, o que dificulta o acesso ao crédito. Ou seja, o dinheiro está caro. Portanto, recuperação judicial à vista.

No dia 11 de janeiro, através de “Fato Relevante”, dever legal em que os administradores da empresa comunicam à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a divulgam via imprensa qualquer ocorrência impactante nos seus negócios, que possa influir na decisão dos investidores do mercado de vender ou comprar valores mobiliários emitidos por ela, o Grupo Americanas noticiou que “foram detectadas inconsistências em lançamentos contábeis redutores da conta fornecedores realizados em exercícios anteriores, incluindo o exercício de 2022”, de modo que “a área contábil da Companhia estima que os valores das inconsistências sejam da dimensão de R$ 20 bilhões”.

O que isso quer dizer? Explico com um exemplo. Um varejista anuncia um produto de um fornecedor na internet. Você que está interessado, compra o produto parcelado em cinco vezes no cartão de crédito no site do varejista. Como você pagou parcelado e produto já foi vendido, a varejista deve pagar o fornecedor do produto imediatamente, mas com que dinheiro? Ela antecipa esse pagamento com capital de bancos. Logo, a varejista passa a dever o banco, que pagou o fornecedor daquele produto que você comprou parcelado e nesta operação, por certo, há juros.

Grupo Americanas fazia isso, mas ao invés de lançar na contabilidade o débito com os bancos (“Empréstimos e Financiamentos”), apresentava essa operação comercial em outra linha contábil (“Fornecedores”). O que isso quer dizer? A modificação do “local da contabilidade” aumentará o débito da companhia, dado os encargos bancários de antecipação de pagamento aos fornecedores, e mudará a ótica de quem com ela contrata (ou empresta dinheiro), pois, a análise de crédito é baseada pela capacidade de pagamento de empréstimos, financiamentos e debêntures, sendo que a dívida com fornecedores fica em segundo plano.

Assim, o fato do Grupo Americanas registrar como dívida aos fornecedores quantias que deveriam estar registradas como empréstimos e financiamentos, criou no mercado forte desconfiança, dando início a uma verdadeira corrida para recuperação de crédito, com vencimento antecipado de diversas obrigações e bloqueio de ativos em conta da companhia, gerando risco iminente de descontinuidade da operação da companhia.

Dada a urgência da situação, que estava sem tempo hábil para reunir toda a documentação para ingressar com um pedido de recuperação judicial, o Grupo Americanas buscou medida de urgência que antecipasse os efeitos de um processo de negociação coletiva, tal qual a preservação de todos os contratos necessários à operação, inclusive manutenção de linhas de crédito, a suspensão da exigibilidade dos débitos e a impossibilidade das instituições financeiras bloquearem os ativos da companhia, obstando o vencimento antecipado das dívidas noticiadas no “Fato Relevante”, o que foi concedido pelo Poder Judiciário, momento em que o Grupo Americanas teria o prazo de 30 dias corridos para apresentar seu pedido definitivo de recuperação judicial, o que foi feito no último dia 19.

Vinicius Rios Bertuzzi

Sócio e coordenador jurídico do escritório full service Aluizio Ramos Advogados Associados, Administrador Judicial pela Escola Superior da Magistratura do Estado de Goiás (ESMEG) em conjunto com a Escola Superior da Advocacia (ESA-GO), possui LL.M (Master of Law) em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/RJ) e atua em processos de recuperação judicial, falência, renegociação de dívidas e execução

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