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O golpe do boleto falso e a LGPD

(Reprodução)

Por Bruno Curado

Temos um agravamento das fraudes bancárias realizadas por meio eletrônico nos últimos dois anos, sendo uma realidade conhecida pela maioria da população brasileira, que tem sido exposta a uma acelerada adaptação aos meios digitais, sem o tempo, preparo e esclarecimentos necessários a este “Admirável Mundo Novo[1].

A preocupação com a segurança da rede, já vem sendo tema de diversas legislações pátrias a certo tempo, e mesmo antes da Pandemia do Covid-19, já havíamos feito o dever de casa neste quesito a fim de trazer proteção aos dados pessoais dos brasileiros, por meio da Lei Geral de Proteção de Dados n.º 13.709/18 (LGPD), como um marco legal abrangente na segurança digital, sem deixarmos de reconhecer as demais normas que tratam do assunto de forma esparsa, como a Constituição Federal, o Código Civil Brasileiro, o Código de Defesa do Consumidor, a Lei do Cadastro Positivo, o Marco Civil da Internet e a Lei do Sigilo Bancário, e a própria  FEBRABAN em seus sistema de Autorregulação ao instituir o seu Normativo de Proteção de Dados Pessoais (SARB 025/2021).

Mesmo diante de uma gama considerável de legislação com o fim de dar proteção aos dados do cidadão brasileiro, é no viés econômico desta proteção que temos observado o maior gargalo, com fraudes bancárias cada vez mais recorrentes, em especial o Golpe do Boleto Bancário Falso.

Em pesquisa nos tribunais pátrios, foi possível identificar que em diversas demandas, temos a narrativa de que o consumidor se depara com um boleto com os seus dados e do seu contrato, logo após ter entrado em contato com a Instituição Financeira credora a procura de alguma negociação e ou quitação.

De forma resumida, o consumidor recebe um boleto com os dados de seu contrato para quitação, e na grande maioria dos casos o boleto bancário não tem nenhuma irregularidade aparente, ou grosseira, guardando o mesmo aspecto dos boletos enviados anteriormente pela entidade credora, porém, o beneficiário do boleto é um terceiro que não possui qualquer relação com o credor, mesmo constando o nome do credor na face do boleto.

A jurisprudência não é uniforme a respeito do tema, muitas vezes exonerando os Bancos de qualquer responsabilidade sobre o pagamento do boleto “falso”, porém, tem cada vez mais se acentuado uma interpretação no sentido de se verificar especificamente o caso, as riquezas de detalhes do boleto “falso” e a existência de um contato prévio do consumidor solicitando o boleto a Instituição Financeira, como um fator preponderante da responsabilidade desta.

A própria LGPD em seu artigo 2º, diz que a disciplina da proteção de dados tem como um de seus fundamentos a “defesa do consumidor”, estabelecendo que os agentes de tratamento adotem medidas de segurança, técnicas e administrativas, que protejam os dados pessoais de acessos não autorizados, possibilitando ainda, a inversão do ônus da prova a favor do titular dos dados, e o fato dos boletos possuírem os dados dos clientes, do contrato com a instituição financeira e muitas vezes serem posteriores a solicitações de acordos ou de quitações com o próprio credor, devem ser analisados sob o prisma de possível vazamento de dados.

Diante deste cenário, temos em auxílio do consumidor a Teoria do Risco do Negócio ou Atividade, contida no art. 14 do CDC, trazendo a responsabilidade objetiva do Banco, conforme Súmula 479 do STJ, ressaltando, que compete ao prestador de serviços bancários, fazer um controle adequado e eficaz na conferência dos dados pessoais de seus clientes, pois, são previsíveis os riscos inerentes à sua atividade e a atuação ilícita de fraudadores, o que pode resultar na responsabilidade da Instituição Financeira pela emissão de quitação do débito que fora objeto do boleto “falso”.


[1] Romance escrito por Aldous Huxley, publicado em 1.932, onde antecipa desenvolvimentos tecnológicos, manipulação psicológica e condicionamento clássico, que se combinam para mudar profundamente a sociedade.

Bruno Curado

Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Goiás – UFG, Pós-graduado em Direito Tributário pela UFG, cursando MBA em Agronegócios pela USP/ESALQ, Mestrando em Ciências Jurídico-Econômicas pela Universidade do Porto – Portugal. Advogado, membro das Comissões da OAB/GO de Direito Bancário e Comissão Especial do Direito do Agronegócio.

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