Brasília Empresas (DF) – Começar um negócio durante uma pandemia pode ser um tiro no escuro. Por isso, uma “luz” cairia bem neste momento ou quem sabe até mesmo um “anjo”, ou melhor, um “investidor anjo” – e eles são mais comuns do que se imagina. De acordo com a associação Anjos do Brasil, o país tem aproximadamente 10 mil desses investidores.
O mercado de crowdfunding, financiamento coletivo, também está em alta. O setor registrou crescimento de 43% em 2020, quando movimentou R$ 84,4 milhões, ante R$ 59 milhões em 2019. Segundo a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o valor apurado no ano passado é dez vezes superior aos R$ 8,34 milhões quatro anos antes. No crowdfunding, os investidores podem fazer aplicações em ideias que ainda não saíram do papel ou em negócios pré-estabelecidos.
André Fróes, CEO da Cotidiano Aceleradora, diz que a perspectiva para 2021 é que o investimento anjo siga crescendo. “O que aconteceu é que a pandemia também trouxe uma pressão para resolver problemas que a gente convivia mas não resolvia, como é o caso das compras pela internet, o teletrabalho e as aulas on-line. Essa quarentena acelerou as transformações digitais e com isso o empreendedor trouxe ideias, afinal, eles enxergam na crise uma oportunidade”.
Antes de ser investidor anjo, Fróes atuou no mercado tecnológico por 6 anos, trabalhando com empresas tradicionais. “A chave virou quando começamos a perceber que as startups menores e com menos recursos estavam alcançando resultados surpreendentes. Então eu e mais alguns amigos pensamos em ideias para empresas, mas observamos que eram muitas ideias, então decidimos investir em pessoas e assim dividiríamos o nosso investimento em mais empresas”, foi aí que surgiu a aceleradora de startups.
O executivo relata que a Cotidiano Aceleradora investiu em mais de 10 empresas em 2020 e a previsão é manter o ritmo para este ano. ” Tem empresas surgindo aí que podem desafiar grandes empresas, a beleza desse movimento é que com poucos recursos você consegue montar estruturas tão boas quanto as de grandes empresas”.
Não é só o dinheiro
O anjo nesse caso “não cai do céu só com uma maleta recheada de dinheiro, mas também com uma mentoria”, afirma Fróes.
“Além do projeto, analisamos quem é aquela pessoa que está por trás da ideia, ele tem o desejo de crescer com aquele negócio? Aquele projeto tem um propósito de facilitar a vida das pessoas?”, questiona Fróes, que logo acrescenta: ” É essencial que a pessoa tenha essa vontade de mudança, assim ela pode suportar os problemas do dia a dia por um propósito maior”.
“Não é só o capital, é orientar o melhor caminho, sugerir parceiras, indicar clientes e fornecedores. Se você é um investidor anjo, você tem que estar lado a lado do empreendedor, tem que estar disposto a chorar com as derrotas e comemorar as conquistas”, diz o CEO.
“Ele acreditou em um slide”
E para o empreendedor, como é começar uma empresa do zero? Diogo Lisita, um dos fundadores da Origem, fábrica de motos elétricas e responsável pela primeira moto elétrica do país, conta que um simples slide abriu portas para um sonho.
“A Origem começou em 2017, somos três fundadores, três engenheiros da UnB. Nós trabalhávamos em outra startup aqui no Distrito Federal, que produzia maquininhas de cartão, lá a gente aprendeu muito sobre produtos: como importa, como distribui, como monta a pré-venda e por aí vai. Ficamos lá de 2012 até 2017 e pensamos, ‘precisamos aplicar o nosso dinheiro’, então escolhemos a parte de veículos elétricos, acreditamos que a eletrização do veiculo é um caminho sem volta”, explica Lisita.
Nesse momento, de acordo com Lisita, eles decidiram se aventurar no mundo dos negócios de motocicletas. “No Brasil, temos um uso massivo de quem usa esse transporte para trabalhar, e isso ficou ainda mais claro agora com a pandemia, por conta do delivery”, diz.
Após desenhar o projeto, chegou o momento de colocá-lo em prática. “Primeiro, usamos o capital próprio para visitar fornecedores e fazer pesquisas. Mas quando decidimos fazer o protótipo não tínhamos dinheiro. Precisávamos de R$ 200 mil, lembrei de um amigo que se denominava investidor anjo e mesmo com um risco altíssimo e nada mais do que um slide, o cara arriscou completamente na gente”, descreve o fundador da Origem.
Com o dinheiro, em 6 meses eles conseguiram fazer um teste para homologar o projeto no Denatran (Departamento Nacional de Trânsito). Porém, o dinheiro do investidor anjo acabou e a ideia precisava seguir. Foi aí que os amigos recorreram à outra rodada de investimento, desta vez procurando os amigos, a família e a Cotidiano Aceleradora. Eles levantaram mais R$ 900 mil para continuar com as fabricações.
Os fundadores da Origem também contaram com rodadas públicas de investimentos e com as crowdfunding. Hoje, a empresa já tem uma fabrica própria e atende a shoppings, a Ambev, o Santander, os Correios e alguns restaurantes.
Como achar o seu anjo
O investidor anjo vai abrir portas para a sua empresa ganhar visibilidade no mercado, mas é importante saber escolher o momento em que você vai procurar essa ajuda e quem vai te ajudar.
De acordo com Guilherme Vasconcelos, mentor da Endeavor, empresa sem fins lucrativos que oferece cursos ao empreendedores, o momento certo para buscar a ajuda de um investidor anjo é quando a pessoa quer evoluir o negócio ou uma ideia, mas não tem recursos financeiros ou materiais. “Eu procuro dinheiro já que não tenho dinheiro o suficiente para alavancar a minha ideia. Nesse momento eu já tenho que ter testado alguns pontos para mostrar a um possível investidor”.
“Agora, preciso fazer esse crescimento, seja com dinheiro ou com mentoria. Para colocar o meu nome no mercado de trabalho é necessário ter um capital. Tanto para contratar pessoas, quanto fazer publicidade e alianças. É aí que entra o investidor anjo”, recomenda Vasconcelos.
Em quem devo confiar? A primeira dica que Vasconcelos dá é conferir se essa pessoa já foi um empreendedor. “Isso traz uma visão de mercado mais ampla e dá mais confiança”, ressalta.
Como encontrar? O mentor afirma que há alternativas acessíveis para quem busca investidores. “Você pode recorrer às associações, ao LinkedIn, ao Instagram, há quem se denomina nas redes sociais como ‘investidores anjos’”.
Quero ser um investidor anjo. Quais são os cuidados?
Rodrigo Franchini, sócio da Monte Bravo Investimentos, avalia que um investidor anjo é bastante arriscado, principalmente por causa do ambiente de “incerteza no movimento jurídico e legislativo”. Para ele, é preciso “tomar um pouco mais de cuidado nas escolhas, no que você vai investir”.
Mesmo assim, esse é um momento propício para investir em empresas. “Com a taxa Selic baixa, os investidores se viram obrigados a investir em outros ativos. A galera correu para investir em startups. Isso trouxe um investimento nesse mercado acima do esperado”, afirma Franchini.
Segundo Franchini, a maneira mais segura de entrar nesse ramo é investir em fundos que compram ações de empresas. “Se a pessoa tem uma dificuldade para ver se aquele investimento vai girar ou não, o interessante é contratar esses fundos que fazem isso por você”.
“Quando você faz a gestão através de um fundo, você está terceirizando esse trabalho e o seu risco pulveriza, afinal se você investe em 25 empresas e uma não dá certo, você ainda tem 24 chances”, conclui Franchini.