*Por Renato Zerbini Ribeiro Leão
Não é segredo para ninguém que um dos principais efeitos negativos da pandemia sobre a juventude brasileira dá-se na educação. Os jovens, sobretudo no ensino público, foram apartados por quase um ano e meio de suas escolas e centros de formação. Segundo as análises, cada ano a menos de estudo na vida de um jovem pode representar uma perda entre 10% e 15% em sua renda futura. Soma-se a esse cenário desalentador, um fenômeno que cresce desde a última década e que se agigantou sob impacto da Covid-19: a fuga de cérebros. Nessa realidade não há segredos e os dados estão aí escancarados.
Em um país distensionado socialmente e observando plena normalidade democrática, os dados recentemente divulgados de que a epidemia da Covid-19 fez saltar a desocupação de trabalho entre jovens de 15 a 29 anos de 49,4% para 56% seriam suficientes para catapultar a mobilização da sociedade em prol da sua juventude. Um observador atento, porém, dá-se conta de que infelizmente no Brasil não está sendo assim. Pelo contrário, segundo os novos estudos da FGV e o mais atual Atlas das Juventudes – edificados a partir de micro dados do IBGE, Gallup World Poll e Nações Unidas – em 2019, 47% dos jovens brasileiros nesta faixa etária anseiam deixar o País. Em 2020, 27,1% dessa juventude nem estudava e nem trabalhava. Destes, 66,8% não tinham qualquer instrução segundo os dados do 4º trimestre de 2020.
Outra preocupante estatística desvendada por esses números é a de que, entre 2015 e 2018, 51,90% dos jovens de 15 a 29 anos agora enxergam o Brasil como um país pobre. Tais números impiedosos podem gerar sentimentos diversos e conflitantes entre si que impactarão na qualidade da resposta a ser oferecida pelo país a esse terrível e perturbador cenário. Um poderia ser a de que esses jovens estão desanimados, alienados e, portanto, são alvos fáceis de uma insistente conspiração mundial contra a grandeza natural, pujança econômica e eterno futuro abençoado do País (por mais caricaturesco que possa resultar, realmente grande parte da elite brasileira assim pensa). Outro seria o de que a juventude se desperta para a terrível realidade das mazelas sociais, ideológicas e políticas que historicamente assolam o país, agora certamente impactando em seu futuro imediato.
A juventude brasileira clama por um futuro promissor, fincado em premissas de inclusão, igualdade, justiça social, pluralidade, universalidade, sustentabilidade e respeito ambiental, onde através de seu próprio esforço e mediante um trabalho decente possa viver dignamente. Visto que está farta com o atual cenário e preocupada com o seu futuro próximo. Tremenda encruzilhada pátria! Alguns caminhos, no entanto, são possíveis de serem trilhados para recuperar o futuro do Brasil e o resgate anímico da sua juventude. Um deles passa pelas sugestões da Organização Internacional do Trabalho (OIT) à luz do conceito de trabalho decente emergido em 1999 e que sintetiza a promoção de oportunidades para que homens e mulheres obtenham um trabalho produtivo e de qualidade, em condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade humanas. Este é considerado condição fundamental para a superação da pobreza, a redução das desigualdades sociais, a garantia da governabilidade democrática e o desenvolvimento sustentável.
Fincado como um pilar para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) definidos pelas Nações Unidas, fulcra-se especialmente no ODS 8, que busca promover o crescimento econômico duradouro, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todas e todos. Trata-se do ponto de convergência dos quatro objetivos estratégicos da OIT.
O primeiro diz respeito aos direitos no trabalho, especialmente aqueles definidos como fundamentais (liberdade sindical, direito de negociação coletiva, eliminação de todas as formas de discriminação em matéria de emprego e ocupação e erradicação de todas as formas de trabalho forçado e trabalho infantil). O segundo visa a promoção do emprego produtivo e de qualidade; o terceiro busca a ampliação da proteção social; e o quarto, o fortalecimento do diálogo social. O que a juventude brasileira busca é ter uma vida digna a partir de seu próprio trabalho. E é justo que assim seja.
Logo, ou a elite brasileira abandona seus interesses acumuladores, egoístas e imediatos, assumindo sua responsabilidade na atual quadra, transformando-a para melhor, ou o país perderá a maioria de seus jovens, especialmente, os mais bem formados. Os filhos e netos dessa mesma elite.
Renato Zerbini Ribeiro Leão
PhD em Direito Internacional e Relações Internacionais, presidente do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU e professor Titular da FAJS/CEUB