Campo Grande Empresas (MS) – A 3R Petroleum e a Eneva anunciaram, nos últimos dias, os seus primeiros contratos para venda de gás natural no mercado brasileiro. Com isso, já são ao menos dez os novos fornecedores de gás com contratos assinados com as distribuidoras e clientes industriais livres no processo de abertura da indústria de gás do país.
Embora a Petrobras se mantenha como agente dominante e o cenário do mercado internacional dificulte uma abertura mais acelerada, os primeiros passos da diversificação do setor já são tangíveis — e podem ser traduzidos em números:
- Ao todo, os contratos assinados por esses dez novos fornecedores de gás no mercado já somam compromissos de entrega de mais de 10 milhões de m³/dia — dentre acordos já ativos e aqueles com início de suprimento previsto para os próximos anos;
- Dez distribuidoras estaduais de gás canalizado já têm contratos assinados com novos supridores, para compra de mais de 5,5 milhões de m³/dia em 2022, de acordo com os dados públicos da ANP. O volume equivale a cerca de 13% do mercado das distribuidoras — desconsiderada a demanda das termelétricas.
A seguir, a agência epbr apresenta um raio-x dos novos atores do mercado brasileiro, com base nos contratos já anunciados pelas companhias no país. A começar pelas estreantes:
3R Petroleum: A empresa, especializada em campos maduros, é a mais nova fornecedora do mercado brasileiro. A companhia assinou contrato com a Bahiagás, para venda do gás produzido nos polos Recôncavo e Rio Ventura, na Bahia. O contrato tem vigência até dezembro de 2023, podendo ser prorrogado em comum acordo, e prevê a venda inicial de 95 mil m³/dia. O volume aumenta gradualmente até 205 mil m³/dia em dezembro.
Eneva: A companhia assinou acordo de fornecimento de gás natural liquefeito (GNL) para a unidade da Suzano, em Imperatriz (MA). Este é o primeiro contrato da produtora de gás com um consumidor industrial. Hoje, toda a produção da empresa é destinada a projetos próprios de termelétricas a gás. O contrato com a Suzano tem vigência de dez anos a partir do início do fornecimento comercial, previsto para 2024. A Eneva vai investir R$ 530 milhões na instalação de uma unidade de liquefação de gás no complexo do Parnaíba, com capacidade instalada de 300 mil m³/dia, voltada para a Suzano e novos potenciais clientes na região.
Quem é quem na abertura do mercado
Alvopetro: A petroleira norte-americana tem contrato com a Bahiagás desde 2020. A empresa opera campos terrestres na Bacia do Recôncavo e foi responsável pela construção da primeira unidade de processamento (UPGN) privada do Brasil. A Alvopetro tem um contrato de longo prazo com a Bahiagás, válido por 15 anos, para a entrega de 150 mil m³/dia na modalidade firme inflexível e 350 mil m³/dia na modalidade interruptível.
Compass: Tem contrato com a Comgás, do mesmo grupo (Cosan). O acordo, de dez anos, vale a partir de 2023, quando a companhia espera começar a operar o Terminal de Regaseificação de São Paulo (TRSP), no Porto de Santos. O volume contratado na modalidade firme é de 3,125 milhões de m³/dia. A Compass tem acordo para compra do GNL da francesa TotalEnergies.
Equinor: A norueguesa, sócia da Petrobras no campo de Roncador, na Bacia de Campos, tem contrato com a Bahiagás para venda de 350 mil m³/dia no primeiro semestre e 300 mil m³/dia no segundo semestre de 2022.
Galp: A petroleira portuguesa, sócia da Petrobras em importantes campos do pré-sal, como Tupi, tem contrato para fornecer 1,15 milhão de m³/dia à Bahiagás até o fim de 2023 e 1,06 milhão de m³/dia ao longo de 2024. A multinacional também tem um acordo com a Gasmig, na modalidade PUT (opção de venda) de 260 mil m³/dia até o fim de 2023; e um contrato para envio de 35 mil m³/dia até o fim de 2022 para a Potigás.
New Fortress Energy: A companhia opera o terminal de GNL de Sergipe e está construindo mais duas plantas de regaseificação, no Pará e em Santa Catarina. A empresa tem contrato com a SCGás para venda de 150 mil m³/dia por cinco anos, a partir da entrada em operação do terminal de GNL de São Francisco do Sul (SC) em 2022. A companhia também tem um acordo com a Copergás (PE), para entrega de 32 mil m³/dia em 2022 e 40 mil m³/dia entre 2023 e 2026. No mercado livre, a NFE tem contrato de 15 anos para fornecimento de 29,5 trilhões de BTU por ano (cerca de 2,2 milhões de m³/dia) à refinaria de alumina da Alunorte, da Hydro, no Pará.
PetroReconcavo: A petroleira, especializada em campos maduros, tem contratos com três distribuidoras diferentes, sendo o principal deles com a Bahiagás. O acordo com a concessionária baiana prevê a entrega de 600 mil m³/dia no segundo semestre de 2022, mas com uma curva ascendente até chegar a 1,1 milhão de m³/dia entre 2024 e 2025 e 1 milhão de m³/dia em 2026. Com a Potigás, a empresa tem compromisso de 236 mil m³/dia até o fim de 2023; e, com a PBGás, para 80 mil m³/dia em 2022 e 100 mil m³/dia em 2023.
Shell: A multinacional é a grande protagonista da abertura do mercado brasileiro de gás natural, com contratos tanto no mercado cativo quanto no livre. Segunda maior produtora de gás do Brasil, a empresa tem acordos com a Bahiagás e Copergás. Com a distribuidora baiana, assumiu o compromisso de vender 840 mil m³/dia em 2022 e 100 mil m³/dia em 2023 e 2024, entre acordos firmes e flexíveis. Para a pernambucana, venderá 740 mil m³/dia em 2022 e 1 milhão de m³/dia em 2023. No mercado livre, fechou contrato com a Unigel, para comercialização de gás às fábricas de fertilizantes da Bahia e Sergipe. Juntos, Unigel, Copergás e Bahiagás demandarão entre 3 milhões e 4 milhões de m³/dia do gás extraído pela companhia no pré-sal, a partir de 2022.
Origem Energia: A operadora de campos maduros tem contratos para fornecimento de gás à Bahiagás e Algás, na modalidade firme inflexível. A empresa tem compromisso de 640 mil m³/dia com a concessionária alagoana; e de 120 mil m³/dia com a Bahiagás a partir do segundo semestre deste ano. O volume com a distribuidora baiana será gradualmente ampliado, até chegar a 1,5 milhão de m³/dia entre 2024 e 2026. A Origem também tem mais um segundo contrato com a Bahiagás, assinado em 2021 por meio de sua controlada Eagle E&P, com validade de seis anos e compromisso de entrega de 150 mil m³/dia, produzidos no Polo Tucano Sul.
Busca por diversificação
As distribuidoras têm intensificado a busca por novos supridores, na tentativa de reduzirem a dependência da Petrobras — em especial num ano em que a estatal aumentou os preços do gás.
De acordo com estimativas da Gas Energy, com base nos contratos públicos, disponibilizados pela ANP, todos os novos fornecedores praticavam, em fevereiro, preços mais baixos que os da Petrobras.
O preço de venda da molécula da 3R para a Bahiagás, por exemplo, varia de US$ 6 a US$ 7 o milhão de BTU — para um Brent de referência entre US$ 75 e US$ 125. A Petrobras, para efeitos de comparação, tem vendido o seu gás a patamares acima de US$ 14 o milhão de BTU, nos novos contratos com as distribuidoras.
No Alagoas, Ceará, Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Sergipe, os novos termos contratuais propostos pela Petrobras — que levaram a um reajuste de até 50% em janeiro — foram judicializados.
A petroleira brasileira alegou o aumento dos custos com a importação de GNL, enquanto as distribuidoras veem nos reajustes abuso de poder de mercado da Petrobras.
A estatal vinha negociando, com as distribuidoras que entraram na Justiça, novos termos contratuais: um prazo estendido de quatro para nove anos, em troca de uma redução na indexação do valor do Brent, de 16,75% para menos de 13%.
As negociações foram interrompidas na semana retrasada, em razão do corte de 30% no fornecimento de gás da YPFB, da Bolívia, para a Petrobras — o que pode levar a uma participação maior de GNL importado, e mais caro, na formação dos preços no Brasil.
Até o momento a Petrobras ainda não retomou as negociações com as distribuidoras estaduais.