A Black Friday de 2023 entrou para a história não pelo estouro de vendas, mas por evidenciar as complexidades do varejo online em tempos de cautela econômica. As vendas totais pela internet viram um declínio de 15,1% em relação ao ano anterior, o que significou um recuo considerável de R$ 3,4 bilhões. Esta baixa foi sentida mesmo entre gigantes do e-commerce, como Mercado Livre e Magazine Luiza, que tiveram de navegar por águas turbulentas para manter o crescimento num contexto econômico desafiador.
Prevista como uma temporada de bonança, com aumento de vendas estimado entre 4% e 17%, a realidade desdobrada foi de uma segunda pior performance desde o início dos registros. Os eletrodomésticos lideraram o ranking dos produtos mais vendidos, com 20,8% do total, seguidos pelos eletrônicos (15,1%) e artigos de telefonia (11,9%). Essa preferência reflete um consumidor voltado para a aquisição de bens duráveis, provavelmente em resposta a um desejo ou necessidade reprimidos de renovação doméstica.
No que tange aos métodos de pagamento, o cartão de crédito permaneceu no topo, com 56,5% das transações, enquanto o PIX confirmou sua popularidade e praticidade com 30,3%. Boletos bancários e outras formas como e-wallets, cashback, débito e vales representaram uma fatia menor, de 5%.
A queda nas vendas online de 2023 espelha a situação financeira dos consumidores, ainda lidando com dívidas e descontos que ficaram aquém das expectativas. Esse cenário foi exacerbado por um varejo que, prevenido pela alta da taxa Selic, preferiu manter estoques ajustados e limitar promoções para proteger a rentabilidade.
Apesar do contexto geral, as vendas em lojas físicas, particularmente em eletrônicos e moda, viram um aumento de conversões, indicando que a experiência de compra presencial ainda possui um forte apelo. Os dados online, contudo, não contemplam essa realidade física, o que pode sugerir um quadro mais matizado.
O volume de pedidos encolheu para 51 milhões, uma contração de 14,9% em relação ao ano passado, e o gasto médio por compra manteve-se estável em R$ 675,36. Curiosamente, o panorama não foi homogêneo entre os varejistas, com alguns aumentando sua participação de mercado, enquanto outros, particularmente os menores e mais dependentes de crédito, sentiram o peso do recuo.
Um efeito colateral menos óbvio, mas significativo, da redução nas vendas foi a diminuição das tentativas de fraude online, que caíram 56,4%, com o ticket médio de fraude registrando R$ 1.439,47. Esse dado pode indicar uma correlação direta entre o volume de vendas e a atividade fraudulenta, um ponto de interesse para futuras estratégias de segurança digital.
Compreendendo os resultados da Black Friday de 2023, o mercado brasileiro se depara com valiosas lições sobre consumo, economia e adaptação em face de um panorama econômico em evolução. As estratégias para futuras edições deste evento promocional, sem dúvida, levarão em conta esses insights, enquanto o setor busca equilibrar as expectativas de vendas com a realidade econômica do país.
Diego Dias Gonçalves
Economista, Cofundador e sócio da Four Finances