Campo Grande Empresas (MS) – As exigências para preparar sistemas modais mais eficientes para transporte de cargas em Mato Grosso do Sul vão passar por um novo período de estresse.
Na atual demanda já não existe estrutura eficiente para atender ao escoamento, e a partir de 2022 existe a previsão de que a produção de minério de ferro no Estado vá aumentar em até 20%.
A necessidade de se utilizar o meio rodoviário para despachar essa carga vai estrangular ainda mais a defasagem que existe em Mato Grosso do Sul.
Os outros recursos disponíveis, como a hidrovia e a ferrovia, estão com impedimentos por diferentes fatores. A hidrovia depende da natureza, com retomada de chuvas que permitam a elevação do nível do Rio Paraguai e a possibilidade de navegação.
Desde outubro, a hidrovia está parada e a previsão de retomada é só para 2022, mas sem data.
A ferrovia, com o sucateamento, ainda não entrou nos eixos, e os processos de concessão seguem tramitando, tanto por parte do governo federal como por medidas que o Estado tenta aplicar.
Essa nova demanda de escoamento surgiu a partir de Corumbá, polo de referência estadual na extração de minério de ferro e de manganês.
O município ainda tem, em menor escala, a extração de outros produtos, como calcário, mármore, arenito, argila e ouro.
Há duas grandes empresas que fazem extração na cidade, Vale e Vetorial/Vetria. A partir de 2022, há a previsão de a Mineração Pirâmide Participações (MPP) retomar as atividades após a 4B Mining anunciar a compra de 51% das ações e ter negócio já contratado pela multinacional suíça Glencore para fornecimento de minério de ferro.
Esse anúncio foi feito agora em novembro ao mercado financeiro e gerou grandes expectativas no mercado local. A retomada de uma mina pode representar aumento de arrecadação em âmbito estadual e municipal, além de geração de empregos.
Essas discussões de caráter considerado positivo são balanceadas por conta da deficiência em termos de escoamento.
Esse assunto já é tratado na esfera federal, porém a melhoria da estrutura de transporte requer investimentos e prazos que podem ser maiores do que o de um ano.
PRODUÇÃO
As produções de Vale e Vetorial/Vetria, anualmente, são de cerca de 3 milhões de toneladas de minério.
Essa extração sendo levada quase que exclusivamente por meio rodoviário por três meses (outubro, novembro e dezembro, quando o Rio Paraguai fica completamente inviável para navegação) já conseguiu inundar a BR-262, com fluxo de cerca de 600 caminhões diariamente. Nos outros nove meses, uma parcela da carga é dividida com o transporte fluvial.
Nessas condições, o trecho rodoviário entre Corumbá e Miranda, que fica no Pantanal, exige manutenção mais sistemática.
A operação que pode inserir nessa rota estafada a necessidade de transporte de mais 600 mil toneladas de minério de ferro ao ano, o equivalente a 20% do que é extraído hoje, vai sobrecarregar um modal que já está acima do limite.
Além disso, as condições atuais de uso mais contínuo do meio rodoviário tornaram o trânsito mais perigoso na BR-262.
Neste ano, em setembro, um engavetamento envolvendo quatro bitrens causou a morte de dois motoristas. Na época, a rodovia ficou por mais de 16 horas com alternância de interdições totais e parciais para atendimento da ocorrência.
No município de Corumbá, houve outros contratempos ocasionados pela grande concentração de bitrens.
Neste mês, um motorista irritado bloqueou o acesso da Vetorial/Vetria e ameaçou outros caminhoneiros, funcionários da mineradora e até policiais militares.
TRANSPORTE
O governo estadual já obteve diagnóstico logístico para o período 2020-2035, e o recorte para Corumbá aponta que o investimento no meio ferroviário é o mais recomendado.
Esse estudo foi feito pelo Observatório Nacional de Transportes e Logística (ONTL), da Empresa de Planejamento e Logística (EPL), inclusive com visita técnica realizada no início de novembro. Esse órgão está ligado ao Ministério da Infraestrutura.
Nesse estudo apresentado à Semagro, a substituição do transporte rodoviário é um critério atrelado à necessidade de desenvolvimento.
“[Há] condição especial na cidade, com acesso farto à multimodalidade. Portos com acesso aos portos do Rio Paraguai, ferrovia Malha Oeste, com acesso aos terminais até Bauru [SP], e aeroporto internacional”, aponta o diagnóstico.
Entre 2013 e 2020, no entanto, o investimento foi massivo no transporte rodoviário, enquanto os demais ficaram relegados. Só ano passado, cerca de R$ 45 milhões foram revertidos para as rodovias, enquanto menos de R$ 5 milhões foram usados para melhorar a calha da hidrovia, a partir de dragagem.
Nenhum valor significativo foi destinado para a ferrovia entre 2013 e o ano passado.
O estudo identificou que, até 2035, Corumbá pode ter crescimento de 40% do comércio interno e externo. Só com São Paulo, o envio de mercadorias alcança R$ 4,8 bilhões.
O projeto ferroviário, apontado como primordial, envolve investimento previsto de até R$ 14,9 bilhões para remodelação dos 1.765 km da Malha Oeste (Corumbá-Santos), sendo a origem majoritariamente do setor privado. Por parte do governo federal, o processo de relicitação está sendo conduzido e a previsão de conclusão do estudo é para o segundo semestre de 2022.
A Semagro também avalia oferecer autorização para uso de todo o trecho da Malha Oeste utilizando-se do Marco Legal das Ferrovias, medida que não exige licitação, mas depende de autorização do governo federal.
“[A nova extração de minério] é mais uma carga para o transporte ferroviário, especialmente se essa produção também se destinar ao mercado interno. Certamente essa informação será considerada pelo grupo que desenvolve o estudo de viabilidade técnica e econômica que subsidiará o processo de relicitação da Malha Oeste”, aponta o secretário de Desenvolvimento Econômico e Sustentável de Corumbá, Cássio Costa Marques.
MINERAÇÃO
A 4B Mining e a MPP, que envolvem empresários de Corumbá e de Campo Grande, sinalizaram para o mercado financeiro, agora em novembro, que existe um contrato nos moldes off-take de cinco anos com a Glencore para a venda de minério de ferro de mina localizada no km 25 da Estrada Parque, perto do Porto da Manga, em Corumbá.
Para garantir esse negócio, a multinacional suíça realizou pré-pagamento de US$ 3,25 milhões.
A 4B Mining assumiu um negócio que estava travado entre a MPP e a Arcelor Mittal. Essas duas empresas haviam fechado uma sociedade 51%/49% em 2008, na cifra de US$ 70 milhões.
Com isso, a MPP ainda mantinha o controle acionário. Por conta da crise mundial instalada naquele ano, a Arcelor Mittal desistiu do negócio e esse entrave arrastou-se por 13 anos.
O projeto, em 2008, estava avaliado em US$ 300 milhões, com possibilidade de extração de minério de ferro e de minério de manganês de alto valor agregado e produção por algumas décadas.
O valor da negociação entre MPP e 4B Mining não foi divulgado.